sexta-feira, 27 de março de 2009

Psicodrama

Psicodrama é uma psicoterapia de grupo, em que a representação dramática é usada como núcleo de abordagem e exploração da psique humana e seus vínculos emocionais.
Procedimento Distinguem-se, no desenvolvimento da ação dramática, três momentos que possuem, cada um, uma importância singular. A primeira fase, chamada aquecimento, é onde se prepara o clima do grupo. Escolhem-se um tema e um protagonista e tenta-se penetrar no mesmo no maior nível de espontaneidade possível. O segundo momento ou fase é a representação propriamente dita, a cena dramática. Aqui ganham importância os eu-auxiliares, que serão os encarregados de encarnar os personagens para os quais o protagonista os escolheu: os personagens reais ou fantasiosos, aspectos do paciente, símbolos do seu mundo. O terceiro momento ou fase é o compartilhar, é onde o grupo participa terapeuticamente. Nesta etapa o grupo devolve, compartilha seus sentimentos e vivências, tudo o que lhes foi acontecendo durante a cena, as ressonâncias que ele produziu.
Técnicas dramáticas As diversas técnicas dramáticas utilizadas durante a representação foram pensadas por Moreno em relação com sua teoria da evolução da criança. Cada uma delas cumpre uma função que corresponde a uma etapa do desenvolvimento psíquico. O diretor do Psicodrama instrumentará, em cada situação, aquelas que pareçam mais adequadas e correspondentes ao momento do drama, segundo o tipo de vinculação que nele se expressa. A primeira etapa de indiferenciação do Eu como o Tu corresponde á técnica do duplo. A segunda, do reconhecimento do Eu, a técnica do espelho. A terceira etapa do reconhecimento do eu, a técnica da inversão de papéis. Mediante a técnica do duplo, um eu-auxiliar desempenha o papel de protagonista. Verbal e gestualmente complementam aquilo que, a partir desse desempenho, entende e sente que o protagonista não pode expressar completamente por ser isto desconhecido ou oculto, por inibições. Coloca-se ao lado e idêntica postura ao protagonista, fazendo seus movimentos, funcionando como a mãe e a criança na primeira etapa. Na técnica do espelho, o protagonista sai do palco e é público da representação que um eu-auxiliar faz dele. Busca-se, com isso, que o paciente se reconheça em determinada representação, assim como na sua infância reconheceu sua imagem no espelho. O terapêutico desta técnica está em que se reconheçam como próprios os comportamentos e aspectos que lhe são desconhecidos e que importam para o esclarecimento do conflito. Utilizando a técnica da inversão de papéis, a mudança de papéis investiga na cena o sentir desses personagens do mundo do paciente. Esta é a técnica básica do Psicodrama. Existem outras técnicas dramáticas criadas por Moreno e posteriores a ele. Moreno, tomando do modelo teatral seus elementos, distinguem, para a cena psicodramática, cinco elementos ou instrumentos: a) Cenário: neste continente desdobra-se a produção e nele podem-se representar fatos simples da vida cotidiana, sonhos, delírios, alucinações. b) Protagonista: o protagonista pode ser um indivíduo, uma dupla ou um grupo. É quem, em Psicodrama, protagoniza seu próprio drama. Representa a si mesmo e seus personagens são parte dele. Palavra e ação se integram, ampliando as vias de abordagem. c) Diretor: o psicoterapeuta do grupo é também o diretor psicodramático. O diretor do psicodrama está atento a toda informação ou dado que o protagonista de, para incluí-la na cena, guia e ajuda a chegar à cena com espontaneidade. Uma vez começada a cena, o diretor se retira do espaço dramático e somente intervém se é necessário incluir alguma técnica, dando ordens ao protagonista ou ego-auxiliares. d) Público: é o grupo terapêutico
Jacob Levy Moreno O médico romeno Jacobo Levy Moreno, foi o criador do Psicodrama e do Sociodrama, é um exemplo de criatividade e dedicação à investigação psicológica e social. Este nasceu na Romênia em 1892 e faleceu nos EUA em 1974. Foi um homem de ampla cultura e forte idéias religiosas e filosóficas, amante do teatro e incansável investigador do homem e seus vínculos, deixou-nos uma vasta obra escrita e um movimento psicodramático que abrange a América, Europa e Ásia. Em 1925, indo morar no EUA, desenvolveu e sistematizou suas descobertas: a socionomia. A socionomia se divide em sociometria, sociodinâmica e a sociatria. A socionomia é o estudo do grupo e suas relações. A sociometria visa medir as relações entre os membros do grupo, evidenciando as preferências e evitações presentes nas relações grupais. Utiliza como método o teste sociométrico. A sociodinâmica se interessa pela dinâmica do grupo e utiliza como método o role-playing ou jogo de papéis. Já a sociatria busca tratar as relações grupais e utiliza três métodos: o sociodrama, a psicoterapia de grupo e o famoso Psicodrama. Com a leitura de suas obras, muitos autores declaram que o psicodrama possui um grande conteúdo emocional e uma audácia renovadora, pois surgiu como uma nova e dinâmica linha de investigação para o conhecimento e terapia dos conflitos psicológicos. Para o surgimento desta teoria, Moreno desafiou críticas, rompeu com o movimento médico da sua época, atacando os valores oficiais caducos, vazios e falsos, conseguindo desenvolver uma teoria baseada numa concepção do homem e da saúde que têm como núcleo a espontaneidade, o otimismo sobre o vital, o amor, a catarse e os papéis que o Eu do indivíduo vai formando. Esta busca pelo reencontro dos verdadeiros valores éticos, religiosos e culturais em uma forma dramática espontânea,(mais tarde, denominado como desenvolvimento do Axiodrama) foi o primeiro conteúdo do Psicodrama. O lugar do nascimento do psicodrama foi um teatro dramático de Viena. Moreno declarou que não possuía nenhuma equipe de atores, nem uma peça e que neste dia apresentou-se sozinho, sem nenhuma preparação, ante um público de mais de mil pessoas. Segundo ele no palco havia somente uma poltrona de espaldar alto, como o trono de um rei, no assento, uma coroa dourada. Surgiu com um intento de tratar e curar o público de uma enfermidade, uma síndrome cultural e patológica que os participantes compartilhavam no momento (Viena encontrava-se em pós-guerra, não havia governo... a Áustria estava inquieta em busca de uma nova alma). Mas psicodramaticamente, Moreno possuía um elenco e uma obra. Uma vez que o público era seu elenco, e a obra era retratada pela trama demonstrada pelos acontecimentos históricos, no qual cada um representava seu papel real. Cada representante de um papel foi então convidado para subir ao palco, e encenar o papel de um rei, sem preparação e diante de um público desprevenido, que funcionava como jurado. Mas neste primeiro momento nada se passou. Ninguém foi achado digno de ser rei e o mundo permaneceu sem líder. Apesar do aparente fracasso desta primeira representação, este foi o marco do nascimento de uma nova modalidade de expressão catártica que, instrumentada pelo exercício da espontaneidade e sustentada na teoria dos papéis, viria a se constituir o método psicodramático de abordagem dos conflitos interpessoais, cujo âmbito natural é o grupo. Surge então, a expressão “psicoterapia de grupo". O psicodrama desde seus primórdios estabeleceu um setting basicamente grupal, com a presença do terapeuta (diretor de cena), seus egos auxiliares e os paciente (tanto como protagonistas como público). Aliás, a expressão, "psicoterapia de grupo" foi pela primeira vez utilizada por Moreno.
Teoria do psicodrama Moreno foi capaz de dar à improvisação dramática e retomou o conceito de catarse. Pois, ao ocorrer uma identificação do espectador com os atores, ocorre como poderíamos dizer uma catartase, e também, certa conscientização. Para que ocorra esta catartase, têm que existir uma espontaneidade e criatividade, pois do contrário, é uma mera repetição que não trará nada de novo nem aos protagonistas nem ao público. É na criação espontânea que se consegue o vínculo do homem com o mundo. O Psicodrama possui o conceito de espontaneidade-criatividade, a teoria dos papéis, a psicoterapia grupal como pontos básicos da sua teoria, além de outros como: Tele (capacidade de se perceber de forma objetiva o que ocorre nas situações e o que se passa entre as pessoas), Empatia (tendência para se sentir o que se sentiria caso se estivesse na situação e circunstâncias experimentadas pela outra pessoa.), Co-inconsciente (vivências, sentimentos, desejos e até fantasias comuns a duas ou mais pessoas, e que se dão em "estado inconsciente".) e Matriz de Identidade (lugar do nascimento).
A teoria da espontaneidade Está ligada dialeticamente à criatividade, compreende uma fenomenologia, uma metapsicologia, uma psicotécnica, uma psicopatologia e uma psicologia genética. As que possuem maiores riquezas são a Psicotécnica ou treinamento da espontaneidade que, ainda que pareça parado, procura resgatar o espontâneo perdido pelo homem ao logo da sua existência e a Psicologia Genética, que grossamente revisando: a criança, ao nascer, realiza seu primeiro ato criativo: é o primeiro ato de catarse de integração. Nasce com uma capacidade criadora própria do ser humano que irá completando com a maturidade e com a ajuda dos outros. O primeiro eu-auxiliar é a sua própria mãe. Ao longo de sua infância, à medida que vai vivendo os diversos papéis e em contato com os agentes sociais, desenvolve essa capacidade criadora e atrofia em maior ou menor medida, de acordo com o tipo de relações e na medida em que as "tradições culturais" lhe sejam impostas pelos mais velhos. Esses agentes da sociedade lhe submetem, durante o desenvolvimento, condutas estereotipadas, repetitivas, ritualistas, muitas delas para ela e para os demais vazias de significado, assim como também ajudam o desenvolvimento da espontaneidade. Depende de cada caso e do meio em que vive a criança em um determinado momento histórico-social. O ato do espontâneo está intimamente ligado ao instante, dali surge a noção do aqui e agora. A filosofia do momento opõe-se à duração, os benefícios do instante, do presente, em constante mudança. É lugar (lócus) onde se dá o crescimento. Segundo Moreno, esta experiência primitiva da identidade configura o destino da criança. Em toda essa primeira etapa, os papéis são psicossomáticos. A segunda etapa é a do reconhecimento do Eu. A criança observa o outro (mãe) como algo diferente dela. Integra as diferentes partes do seu corpo numa unidade e é a partir dali que se diferencia. É na segunda etapa que aparecem os papéis psicodramáticos. Moreno faz uma pormenorizada descrição da evolução da imagem do mundo da criança, distinguindo: Matriz de identidade total: primeiro universo: tudo é um. As configurações estão configuradas pelos atos. Matriz de identidade total diferenciada: segundo tempo do primeiro universo diferenciam-se as unidades, porém têm o mesmo grau de realidade, os indivíduos, os objetos imaginários e os reais. Matriz da lacuna entre fantasia e realidade: começam a se organizar dois mundos, o da realidade e o da fantasia. Isto, na linguagem moreniana, marca o começo do segundo universo. O ideal é que o indivíduo possa dominar a situação e que não desenvolva um mundo real em detrimento da fantasia, nem vice-versa.
Teoria dos papéis O termo "papel" é um conjunto das várias possibilidades identificatórias do ser humano. Os papéis psicodramáticos expressariam, as distintas dimensões psicológicas do eu (self) e a versatilidade potencial de nossas representações mentais. Nesta teoria, toma se os papéis como núcleo do desenvolvimento egóico, e à medida que a criança cresce e se diferencia, vai podendo ampliar seu leque de papéis. Alguns papéis ficarão inibidos, necessitando, posteriormente, serem resgatados (função do Psicodrama).
A Psicoterapia grupal Moreno assim a define “a psicoterapia de grupo é um método para tratar, conscientemente, na fronteira de uma ciência empírica, as relações interpessoais e os problemas psíquicos dos indivíduos de um grupo...” na sua concepção, todos no grupo são agentes teraupêticos, e todo o grupo também o pode ser em relação a outro grupo. Este método aspira alcançar o melhor agrupamento de seus membros para os fins que persegue. Não trata somente dos indivíduos, mas de todo o grupo e dos indivíduos que estão em relação com ele. Em sua relação sociológica vê a sociedade humana total como o verdadeiro paciente. O conceito de encontro está no centro da psicoterapia de grupo, comunicação mútua que não se esgota no intelectual, mas que abrange a totalidade de seu ser. O encontro vive no "aqui e agora". Vai mais além da empatia e da transferência. Forma um "nós". Moreno enumera os métodos a serem utilizados, entre os quais destacam-se: método de clube ou associação, de assessoramento, de conferência, de classes, psicanalítico, visuais, discussão livre, sociométricos, de histórias clínicas, da bibliografia, magnetofônico (sessões gravadas), da música e da dança, ocupacionais e laboratoriais e o que se destaca é o método psicodramático.
Psicodrama psicanalítico O psicodrama psicanalítico nasceu na França em 1944. Hoje, há uma corrente na qual define que a cena dramática é reconhecida na função de concentrar o drama e permitir que apareçam novos significantes. Dizem que “...o Psicodrama não é a busca de um certo sentido nem tampouco de um significante fundamental. Por isso, deve-se evitar a interpretação que proporcione o sentido e a perda do sentido...” Conforme Anzieu "...o psicodrama analítico favorece a expressão dos conflitos por intermédio de imagens simbólicas..." caracteriza quatro aspectos importantes no Psicodrama: dramatização dos conflitos, comunicação simbólica, efeito catártico e natureza lúdica. Na América Latina, a Argentina é o país pioneiro em Psicodrama. Atualmente , Brasil, México e outros fizeram um importante desenvolvimento, sendo pertinente destacar o Psicodrama no Brasil que, inicialmente foi desenvolvido por docentes argentinos e, atualmente, por seus próprios docentes. Para Osório,[1] a teoria moreniana, que se torna pouco sólida, se a compararmos com a teoria psicanalítica, tem , entretanto, alguns aspectos que não são excludentes, mas que se complementam e, em alguns casos, são parcialidades de conceitos psicanalíticos não reconhecidos e rebatizados com outros nomes ou trabalhados sob outros ângulos, como acontece com os conceitos de regressão e fixação. A regressão em Psicodrama não se obtém através da transferência, mas através de cena dramática que torna presente o passado. Tele e transferência em Moreno são conceitos herdeiros do de transferência freudiano. Espontaneidade, essencialmente, está relacionada com o conceito de libido de Freud. Se nos fixamos na cena dramática, esta desde o ponto de vista moreniano fundamenta seu valor da seguinte maneira: a representação dramática é liberadora, é uma segunda vez, é a forma que adquirem o passado e o futuro, no presente. O encontro, o compartilhar, a criatividade e o ato espontâneo possibilitam novos papéis e resgatam energias perdidas. Isto levará a uma catartase de integração e a uma catarse do público. A cena é a representação do passado, um lugar simbólico onde se revela o imaginário através das cenas atuais ou manifestas, podendo explorar e elaborar situações conflitivas do mundo externo, encontrando sua conexão com o mundo interno dele ou dos indivíduos, em sucessivas ações dramáticas com cenas antigas e inconscientes. Sintetizando, a cena dramática é, basicamente, a presentificação e corporização que, através da representação, têm os vínculos intrapsíquicos em sua mútua e dinâmica reestruturação com os vínculos interpessoais.
Notas e referências OSÓRIO, Luiz Carlos. Grupos : teoria e prática : acessando a era da grupalidade. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. 210p. GRUPOTERAPIA hoje. Porto Alegre: Artes Medicas, 1986. 358p.

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