segunda-feira, 31 de maio de 2010

A profissionalização política - Primeira parte (Francisco Ferraz)


A política é um ofício porque o político é um profissional da vida pública. Mas não é desta maneira que a sociedade e os próprios políticos concebem a carreira no poder.

Já dizia o escritor escocês Robert Louis Stevenson, autor dos clássicos "A Ilha do Tesouro" e "O Médico e o Monstro":

"A política talvez seja a única profissão em relação a qual se considera que nenhuma formação prévia é necessária."

A origem do poder Executivo é a monarquia e a do Legislativo, as câmaras de nobres e, mais tarde, também de burgueses. Tais procedências marcaram a política como uma atividade "desinteressada", "amadora" e um "incômodo" que os bem-nascidos deviam suportar em razão da responsabilidade e da prerrogativa de governar o povo, historicamente atribuídas a eles. Assim, era inconcebível a idéia de gratificar a atividade política. Na época, somente recebiam remuneração fixa e regular os empregados, os subalternos. Um governante e um parlamentar -de extração nobre ou burguesa - não poderiam então ser submetidos a tal constrangimento qu e,além de desnecessário, era percebido como humilhante.


O primeiro avanço verdadeiramente firme em direção ao tratamento profissional da atividade política ocorreu na Inglaterra, em maio de 1838, durante a primeira fase do Movimento Cartista - ação operária e popular que recebeu este nome porque recolheu 1,2 milhão de assinaturas em favor de uma petição conhecida como "Carta do Povo". No documento entregue ao parlamento inglês os cartistas reivindicavam cinco pontos:

Sufrágio universal
Voto secreto
Parlamentos anuais
Justa e adequada remuneração aos parlamentares
Eliminação dos requisitos de propriedade para ser candidato

A formulação do argumento em favor da remuneração era a seguinte: "Os trabalhos de um representante eleito que é zeloso no desempenho de seus deveres são numerosos e onerosos. Não é nem justo, nem razoável, nem seguro que eles continuem a ser prestados gratuitamente. Nós reivindicamos que na futura eleição dos membros desta honrada Casa seja destinado a cada um dos representantes eleitos uma justa e adequada remuneração pelo período de tempo em que ele desempenhe suas funções públicas, provida com fundos dos impostos públicos."

Embora rejeitados pelo parlamento, os princípios da "Carta do Povo" que, na maioria, integraram o ideário das Revoluções Americana e Francesa, terminaram por se impor. O estigma aristocrático das funções de governo e de representação, entretanto, perdurou até os nossos dias. É ele que impede a classificação da atividade  política como um ofício, ou carreira, no qual o patrão é o povo -seleciona o ingresso, fixa as promoções e remove das funções pelo exercício livre e soberano de sua vontade expressa no voto.

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